Atualmente, nós vivemos no mundo da alta definição. Praticamente todo eletrônico o que a gente vai comprar hoje vem com uma tela, e a resolução dessa tela é parte fundamental do processo de tomada de decisão, em favor de um produto ou de outro. Ninguém nem compra mais TVs que não seja 4K, ou celulares que gravem vídeo com qualidade menor que UHD. Isso muda os níveis de exigência para nós, fotógrafos, porque nossos consumidores visualizam nosso trabalho nessas telas e, por isso mesmo, exigem sempre que a definição das nossas fotos seja o mais perfeita possível. Nesse sentido, o foco tem se tornado a técnica mais desafiadora da fotografia atual, e o que pretendo mostrar nesse artigo é que tamanho é documento, e que a câmera full frame ainda é a melhor nos dias de hoje.
Até uns anos atrás, como a definição não era um problema tão dominante porque as câmeras possuíam resoluções muito maiores do que todas as outras mídias, a discussão sobre sensores girava em torno do nível de ruído e da sensibilidade. Só que isso mudou porque as câmeras evoluíram e as outras mídias também. Hoje, a discussão sobre o que vale mais a pena, se é APS-C ou full frame, mudou completamente. Vamos dar uma olhada a fundo nessa questão.
Por que tamanho do sensor da câmera da importa?
A relação entre foco e definição é direta, porque o que está no foco é justamente o que fica nítido na imagem. Até uns anos atrás, quando as telas ainda não tinham tanta definição e o os sensores das câmeras tinham poucos megapixels, esse problema não era tão grave. Por exemplo, uma tela de TV considerada HD tinha 1280×720 pixels, que dá um total de 0,9 megapixels. Qualquer camerazinha barata tinha 6. A coisa começou a complicar no momento em que a resolução dos dispositivos começou a aumentar e o tamanho das impressoras fineart também. Entender isso é bem simples, tem um pouco de matemática, mas segue o fio.
O sensor de uma câmera fotográfica tem um formato retangular, sendo o full frame considerado o padrão. Um sensor desses tem 36 x 24 mm. O sensor é dividido em pixels, que são os pequenos pontinhos individuais que formam a imagem. Um sensor com um total de 24 megapixels tem, nessa direção de 36 mm, 4 mil pixels. Então, cada pixel tem aproximadamente 9 mícrons de comprimento, ou 0,009 mm. Esse é o tamanho de um pixel numa câmera full frame de 24 megapixels.
Agora, vamos imaginar um outro sensor, também full frame de 36 x 24 mm, mas que tenha apenas 1000 pixels na direção mais longa. Nesse caso, cada pixel tem 36 mícrons, ou 0,036 mm. Ou seja, os pixels nesse sensor de baixa resolução são 4 vezes maiores do que no outro. E o que isso tem a ver com o foco?
Quer dizer que, quando você ampliar a foto, tudo o que não estiver perfeitamente focalizado vai aparecer. Isso acontece por um motivo muito simples. Dependendo da definição que você seguir, são precisos três colunas de pixels para definir uma linha reta horizontal ou vertical, que é o elemento mínimo de uma imagem – um ponto necessitaria de 3 colunas e 3 linhas, sendo mais difícil de definir. Então, para uma linha estar perfeitamente no foco no sensor de 24 megapixels, a imagem que chega no sensor tem que ter, no máximo 27 mícrons. Já no de resolução menor, teria que ter 108 mícrons!
O filme é o rei da resolução. Chora digital!
Essa discussão toda parece nova, mas nunca foi. No tempo das analógicas existiam muitos formatos de filmes diferentes, os principais sendo o 35mm e o 120. O 35mm é que definiu o padrão full frame de 36 x 24 mm. Já o 120 era 60 x 60 mm, apresentando a mesma área. Essa câmera da foto abaixo é uma típica representante do formato 120. A coisa fica interessante se usarmos a mesma emulsão nos dois filmes. Nesse caso, o tamanho da área dos grãos de prata em relação à área total do filme é bem menor do que no 35mm.
Isso quer dizer que o filme 120 consegue uma resolução espetacularmente maior que o 35mm, mesmo usando a mesma tecnologia! Existem formatos ainda maiores, e a resolução equivalente de uma foto analógica pode chegar facilmente na casa dos terapixels. Como curiosidade, a câmera do avião espião U2, usado ainda hoje pela Força Aerea dos EUA para reconhecimento de território inimigo, usa filme porque não existe tecnologia digital com resolução suficiente. Isso é pra você ver que a relação entre o tamanho do sensor e a resolução é uma questão de geometria e física, não de tecnologia.
Por que a câmera full frame ainda é melhor que a APS-C para resolução?
Isso tudo quer dizer que uma lente que produz uma imagem bem afiada num sensor de baixa resolução pode ser uma bela porcaria num sensor mais moderno. E esse problema se agrava formidavelmente conforme o tamanho do sensor diminui. Por exemplo, um APS-C padrão tem 24 x 16 mm. Então, com os mesmos 24 megapixels, cada pixel de um sensor APS-C teria cerca de 6 mícrons. Ou seja, quanto menor o sensor da câmera, mais ela vai exigir que a lente seja boa, porque a imagem que ela gera sobre o sensor precisa ser cada vez mais detalhada.
É por isso que lentes de câmeras antigas costumam não dar bons resultados em câmeras novas. Elas precisavam cumprir requisitos muito menos exigentes do que as atuais. Tenho muitas lentes que comprei com câmeras analógicas e que produzem imagens magníficas no filme, mas quando uso na minha digital, o resultado quase nunca é bom.
Até pouco tempo atrás, o argumento em favor das câmeras full frame, que custam a partir do dobro de uma APS-C, era o nível de ruído. Ultimamente, essa distância diminuiu porque foram descobertos novos materiais mais sensíveis que tornaram os sensores menores tão eficientes quanto os maiores. Porém, hoje, em 2021, com telas de alta resolução e a moda de imprimir quadros em tamanhos escatológicos, a atenção foi parar no foco porque é ali que está o limite.
Aberrações e difração
As distorções são outro fator importante, e o principal tipo de aberração é a cromática. Quando a luz branca, que é a mistura de todos os comprimentos de onda possíveis, passa por um elemento refrator, como uma lente, os comprimentos de onda maiores e os menores sofrem desvios diferentes. Isso quer dizer que o que é violeta vai para um lado e o que é vermelho vai para o outro. O resultado é como nessa imagem abaixo, onde os objetos mais finos ficam com essa sombra avermelhada. As lentes modernas possuem designs extremamente complexos justamente para combater esse tipo de efeito.
Como você deve imaginar, esse desvio costuma ser muito mais perceptível quanto menor for o pixel. Então, uma lente que pode nem ter uma aberração cromática muito notável num sensor full frame pode ser um desastre completo no APS-C, como é o caso da lente que usei nessa foto acima. Originalmente, essa lente veio numa Sears KS500 analógica que, por definição, é uma full frame. Quando fotografo no filme, o resultado sempre é ótimo. Quando uso na K70, que é APS-C, raramente fica bom. Na foto acima até pode parecer aceitável, mas o que acontece quando amplio até 1005? Veja abaixo o detalhe da janela. Numa câmera full frame, como os pixels são maiores, esse efeito seria menor, apesar de precisar de mais ampliação.
Porém, conforme a gente vai fechando a lente, geralmente a definição vai aumentando. Só que chega num limite em que ela começa a cair de novo. Isso acontece por causa de um outro fenômeno de óptica, que é a difração. Sempre que a luz passa por uma abertura muito pequena ou uma borda muito afiada, ela sofre um desvio que borra a imagem. Então, quando a lente é muito fechada, pra cima de f16, geralmente, a definição costuma começar a cair por causa desse efeito. Como é de se esperar, isso é muito mais notável se o tamanho do pixel for pequeno. Em suma, os sensores full frame colocam muito menos requisitos na óptica do que os APS-C.
É possível conseguir bons resultados com o APS-C
A questão então, pelo menos do meu ponto de vista, é se a definição da foto é o fator mais determinante para você. Se você produz imagens para telas de alta resolução, coisas que precisam ser cortadas ou bastante ampliadas, fotos para impressão em formatos muito grandes e qualquer outra aplicação que demande alta definição, então o negócio é gastar uns cobres e ir no full frame mesmo. Acho que o maior requisito de resolução hoje são esses quadros enormes, de quase 2 metros de largura, que viraram moda. Pra quem faz isso, resolução é tudo.
Já as câmeras APS-C farão perfeitamente bem trabalhos que demandem menos definição. Se o seu trabalho vai parar só no Instagram ou impressões de, no máximo, tamanho A3, como é o meu caso, o APS-C vai dar conta tranqüilo, desde que você use lentes desenvolvidas para esse formato, conforme já expliquei ali em cima.
Sensor menor, mais zoom
Como a área da imagem do APS-C é bem menor, as distorções nos cantos da imagem também são menores. As câmeras APS-C sempre tenderão a apresentar menor distorções geométricas do que as full frame equivalentes. Além disso, como sensor é menor, quando acoplamos uma lente desenvolvida para full frame, é como se o sensor da APS-C fizesse um recorte na imagem total, e isso equivale a um zoom óptico. Isso quer dizer que o campo de visão de uma APS-C é menor e que a ampliação da imagem é maior.
Via de regra, é como se no APS-C a distância focal da lente ficasse um pouco maior, e o fator de correção, que é o chamado crop factor, costuma ser 1.6 para Canon e 1.5 para as demais. Então, pra quem gosta de coisas que precisem de bastante zoom e distância focal, como astrofotografia e spotting de aviões, talvez uma boa APS-C seja melhor do que uma full frame de entrada.
Uma curiosidade é que essas câmeras superzoom, que são conhecidas popularmente por semi-profissionais (que é enrolação, evidentemente), sempre possuem sensores minúsculos, de formato 1/2.8″ ou até menor. A razão é justamente que é possível fazer um recorte menor na imagem, aumentando muito a ampliação. Pra esse tipo de sensor, o crop factor chega a ser até 5, então uma lente de 200 mm numa câmera dessas equivaleria a uma de 1000 mm numa full frame! É essa a mágica de câmeras com zoom espetaculares como a Nikon P1000, que é um dos sonhos de consumo que eu tenho. Uma câmera dessas não serve para fazer fotos comerciais para outdoor ou decoração, só que dá pra fazer coisas altamente divertidas como fotografar planetas. Tudo é questão de finalidade.
Antes de vender a família para comprar uma câmera full frame
No fim das contas, o formato APS-C tem pouquíssimas vantagens sobre o full frame, ficando por conta só do custo bem menor e do ganho de distância focal, que nem sempre é bem vindo. Então, a questão mesmo costuma cair sobre a grana, afinal as full frame custam o mesmo que um carro usado em bom estado (bom, eu consigo achar carro usado em bom estado por 5 mil, mas não costuma ser o caso da maioria das pessoas!).
Só que, antes de partir para a câmera nova, primeiro certifique-se de que você aprendeu a extrair tudo o que é possível da sua câmera APS-C atual. Muitas vezes, o seu requisito de resolução pode estar muito bem ser atendido pela sua câmera, desde que você domine todas as técnicas e extraia o máximo dela. Via de regra, eu nunca troco um equipamento até ter certeza absoluta que é ele que não dá mais conta do recado, e não eu que não consigo colocá-lo no limite.
Porém, se você já testou tudo, aprendeu a otimizar a câmera como ensino nesse artigo, usou todas as técnicas possíveis, como hiperfoco, e o resultado sempre fica mais ou menos quando você amplia no 100%, então é uma boa hora para fazer o upgrade. Olhe para as suas fotos no formato final e verá se precisa ou não de mais resolução, aí é que está o juiz final se você precisa ou não de uma câmera full frame.
Muito bom esse artigo, ficou didático parabéns!