Você entende os números da lente da sua câmera?

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Toda lente de câmera é identificada pelo nome do fabricante, do modelo e por duas seqüências de números. O fabricante e o modelo é tranqüilo, né? Mas e os os números? O que eles querem dizer exatamente? Pra piorar mais a situação, essas denominações nem sempre são muito claras por parte dos fabricantes, e as pessoas também não entendem muito bem o que acontece.

Mas, ainda assim, tem algumas coisinhas a mais que a gente não encontra com facilidade por aí. Inclusive, nem mesmo a maior parte dos gringos entende direito essas coisas. Um dos motivos é que os números da lente da câmera não são necessariamente medidas reais das suas características, mas valores equivalentes a um padrão. De todo modo, entendendo os conceitos o resto flui.

A abertura máxima

Vamos começar com uma lente simples, como exemplo. Tenho aqui uma Pentax-M, e na frente está escrito 1:1.4 50mm. O 1:1.4 é o que a gente chama de abertura máxima, e ele é a razão entre a distância focal e o diâmetro da lente. Nessa lente, especificamente, quer dizer que ela tem um diâmetro de 35mm (50/1.4 é aproximadamente 35). Até conferi com a régua e é verdade mesmo.

Outro exemplo é uma SMC Pentax que está escrito 1:4/200. Nesse caso, ela tem uma abertura de 1:4 e uma distância focal de 200mm. Então, a lente deve ter um diâmetro de 200/4=50mm. E é isso mesmo, pode ir lá medir que vai dar certinho.

Então, a abertura máxima dá a relação entre o tamanho da lente e a sua distância focal. Isso é importante por diversos motivos, mas, principalmente, porque quanto maior a lente, maior a sua resolução. Em segundo lugar, tamanho é documento, e uma lente grande consegue coletar mais luz. Portanto, uma lente com um número de abertura grande consegue maior resolução e capturar mais luz justamente por ser maior. (1:2=0,5 e 1:4=0,25, então 1:2 é maior que 1:4, certo?)

Inclusive, talvez você já tenha ouvido falar em lente rápida. Isso nada mais quer dizer do que uma lente com uma abertura bem grande, e ela é dita rápida porque consegue capturar bastante luz e, por isso, diminui o tempo de exposição. Já uma lente lenta, você deve ter deduzido a essa altura, é uma que coleta pouca luz e, por isso, exige tempos de exposição maiores.

A confusão desnecessária do f-number

Aí, pra complicar ainda mais os números da lente da câmera, a gente chega numa coisa que muita gente tem dificuldade, que é o f-number. Em praticamente todo lugar, a gente vai ler coisas do tipo ‘quanto maior a abertura, menor o f-number‘. Essa confusão acontece porque as pessoas, inclusive os fabricantes, leem somente o denominador da abertura, e não o valor completo. Se você olhar aí na sua câmera, vai ver que a abertura ignora o ‘1:’. Então f 1:5.6 vira simplesmente um F5.6.

Mas, se você lembrar que uma abertura é uma fração, esse problema desaparece. Por exemplo, 1:2 é 0,5. Já 1:1.4 é 0,74. Eu não sei, mas no meu tempo 0,74 era maior que 0,5, então 1:1.4 é uma abertura maior que 1:2, tanto numericamente quanto na prática. Ou seja, todo esse negócio é uma confusão desnecessária.

Profundidade de campo e bokeh

Uma outra característica que é ditada pela abertura máxima é a profundidade de campo. Já escrevi um artigo bem completo sobre o assunto. Para resumir a história, a profundidade de campo é o intervalo de distâncias que uma coisa pode estar e ainda assim ficar nítida na foto. E uma coisa muito importante é que ela depende muito da abertura e da distância focal da lente. Na verdade, ele é uma função da combinação de vários fatores que incluem os dois números que especificam a lente da câmera.

Quanto maior a abertura e quanto maior a distância focal, menor a profundidade de campo. Isso quer dizer que é mais difícil deixar as coisas no foco, mas que também é mais fácil conseguir aqueles belos efeitos de fundo desfocado, ou bokeh. Então, uma lente com uma abertura máxima maior permite fazer algumas coisas a mais. É por isso que os fabricantes sempre estão tentando aumentar a abertura das lentes, e os fotógrafos sempre comprando lentes novas, maiores e mais caras.

Além disso, sempre é possível fechar uma lente através do seu diafragma. Então, com uma lente dessas, dá pra ir desde uma profundidade de campo muito pequena, de alguns milímetros, até uma infinita, capaz de deixar paisagens inteiras no foco. É por isso que aberturas maiores são sempre desejáveis, porque elas permitem maior flexibilidade.

Abertura, precisão e número de elementos

Um outro aspecto bem importante é que quanto maior for a lente, mais fácil de fabricá-la com precisão. Acho que todo mundo pensa que o formato ideal de uma lente é esférica, mas isso não é verdade. Na realidade, esse formato segue uma equação bem mais complexa, que é bem difícil de fabricar na prática. Porém, é muito mais fácil de se aproximar desses formatos quando a lente é maior, porque é preciso de um maquinário menos preciso.

Só que, por outro lado, fabricar coisas de materiais como vidro e óxidos de terras raras não é exatamente uma tarefa fácil, sem contar o custo do próprio material. Então, fabricar lentes grandes custa mais caro por causa disso, e não pra usar processos como moldes, como em lentes pequenas de plástico, que é o caso dos celulares. O desafio dos fabricantes é justamente encontrar um ponto de equilíbrio nessa coisa toda.

Além disso, você deve ter notado que toda lente tem um determinado número de elementos, e isso até vem escrito na propaganda, às vezes. As lentes das câmeras não são uma única peça óptica, mas sempre um conjunto que varia entre 3 e 9 peças, mas pode ter até mais. A razão disso é que uma lente simples cria diversas distorções indesejadas, como aberração cromática, distorção de coma, efeito barril e várias outras. A função de todos esses elementos é diminuir essas distorções.

Mas, por outro lado, quanto maior o número de elementos, mais desvios a luz sofre e mais perdas ópticas surgem no caminho. Então tem que ter um equilíbrio entre o número de elementos e a qualidade da imagem. Via de regra, a lente que tiver a melhor qualidade com o menor número de elementos, vence.

Distância focal

O segundo dos números que toda lente de câmera tem é bem mais controverso de definir, justamente porque os inúmeros elementos de uma lente moderna de fotografia fazem com que algumas definições não funcionem muito bem. Em uma lente simples, tipo a de um óculos, a distância focal é aquela em que um feixe de luz colimado converge para um único ponto. Parece meio complicado, mas é aquela história de matar formiga com lupa.

Se você colocar a lente no Sol, vai ver ela concentrar a luz num ponto. Quanto maior a distância entre a lente e esse ponto, maior a distância focal. Então, isso quer dizer que se eu colocar a lente da minha câmera no Sol, ela vai focalizar a luz naquela distância que está especificada na frente? A resposta é não. Pode tentar. Uma ou outra vai passar perto, mas a maioria não.

O que realmente é a distância focal

Existem algumas razões pra isso ser assim. Primeiro, como disse ali em cima, toda lente de câmera tem múltiplos elementos, aí essa distância seria medida em relação ao qual deles? Ao centro da lente? Ao fundo? À frente? Em todas as lentes que tenho aqui, nenhuma segue um padrão.

Em segundo lugar, toda lente é projetada para ser usada em um tipo específico de câmera, e a distância entre o sensor e a lente varia de modelo pra modelo. Então, a lente precisa ser projetada de modo a formar uma imagem naquela distância e com aquele campo de visão determinado, e isso faz com que a distância focal do conjunto todo não seja necessariamente uma medida física.

O que acontece, de fato, é que a distância focal da lente é, na verdade, uma especificação equivalente ao campo de visão. Por exemplo, uma lente da Canon de 200mm deve conseguir ter o mesmo campos de visão – ou ter a mesma ampliação, que uma de 200 mm da Nikon, mesmo sendo câmeras com especificações bem diferentes. Imagina a confusão se cada lente saísse com a sua distância focal real, ninguém ia entender mais nada mesmo.

O que isso quer dizer na prática

O campo de visão, no fundo, nada mais é do que o que você está vendo ali no viewfinder ou na tela. Por isso mesmo, ele tem a ver com a ampliação da lente e, quanto maior for esse número, maior a ampliação. Uma lente de 18mm é considerada uma grande ocular porque ela consegue um campo de visão bem aberto, ampliando bem pouco as coisas. Já uma de 600mm consegue ampliar bastante as imagens, e você consegue fotografar coisas que estejam bem longe.

Então, para escolher a melhor distância focal, você tem que ter em mente se precisa ampliar ou não a imagem. Também é importante ter em mente que distâncias focais mais longas implicam em maiores aberrações cromáticas e que também é preciso estabilizar bem a câmera pras fotos não ficarem tremidas.

Lentes zoom

Tudo isso que falei até agora diz respeito às lentes com distância focal fixa, também conhecidas por lentes prime. Porém, esse não é o tipo mais comum no mercado, hoje. Praticamente toda câmera vem com uma lente zoom, que nada mais é do que uma lente que dá pra ajustar a distância focal. E esse tipo de lente de câmera continua seguindo o mesmo padrão de números das prime.

Nessas lentes, geralmente os números vêm em intervalos. Por exemplo, tenho aqui uma SMC Pentax-DAL 1:3.5-5.6 18-55mm. O que isso quer dizer é que a distância focal pode variar entre 18 e 55mm, e que a abertura máxima em 18 mm é 1:3.5 e em 55mm é 1:5.6. Todas as coisas que eu disse ali em cima se aplicam do mesmo jeito, com a única diferença que dá pra dar zoom com uma lente dessas.

Além disso, você deve ter notado que a abertura no zoom máximo é menor, né? Isso acontece porque a lente, obviamente, tem um diâmetro fixo. Então, como a abertura é a razão entre a distância focal e o diâmetro da lente, conforme a gente aumenta a distância focal, a abertura tem que diminuir.

Com relação à qualidade, antigamente as lentes zoom eram bem inferiores às prime. Hoje, isso já não é bem verdade, e tem muita lente zoom de alta qualidade por aí. Só não espere uma performance espetacular em lentes com muita variação de distância focal. Enquanto uma 18-55mm faz o trabalho bem feito, pode parecer tentador ir pra uma 28-300mm. Só que, normalmente, o desempenho dessas lentes com grande variação é bem ruim. É por isso que, normalmente, os fotógrafos costumam ter uma 18-55mm e uma 70-200mm.

Uma última curiosidade é com relação ao número de ‘x’ de zoom de uma câmera. Isso aí nada mais é do que a distância focal máxima dividida pela mínima. Por exemplo, uma 18-55mm é uma lente de 3x. Já uma 70-200mm é uma 2,85x, e assim por diante. Essas câmeras superzoom, com coisas do tipo 60x, usam um truque bem interessante com o tamanho do sensor pra conseguir toda essa ampliação, e jogam com uma coisa chamada crop factor. Mas esse é um assunto mais complexo que vou deixar pra outro artigo.

Acho que, por hoje, já está bom. A galera não lê artigos muito longos mesmo, sem contar que já tá cheio de números e com informação demais sobre a lente da câmera. Não esquece de me seguir no Instagram. Lá costumo colocar um monte de coisas que não tem aqui!

Fábio Ardito

Pelo mundo atrás de treta.

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