Essa é uma daquelas perguntas que todo aluno chateado com um trabalho sobre arte com prazo pra entregar acaba fazendo. Por que eu tenho que fazer essa pesquisa se arte não serve pra nada? Bom, é bem provável que você, caro leitor, tenha vindo parar nesse artigo justamente por esse motivo.
Sendo honesto, não vejo muitas possibilidades de alguém colocar a pergunta ‘para que serve a arte’ no Google além da pura indignação. Não vamos fingir que somos um povo culto e a verdade é que a arte é, para o brasileiro comum, uma mera frescura de trabalho escolar.
Olha, eu te entendo. A maioria dos professores não sabem nada do assunto, os sites são todos conteúdo repetitivo e padronizado daquele mesmo material maçante de sempre e praticamente ninguém no Brasil sabe usar a arte. Juntando isso tudo, a arte vira uma coisa artificial que é apenas mais um obstáculo do meio educacional.
Se você veio parar aqui por causa disso, tenho uma coisa ou outra para te dizer que, certamente, vai te interessar. Por outro lado, esse ensaio também deve servir para quem veio parar aqui por outros motivos. De todo modo, senta aí que o tio vai te contar umas coisas que provavelmente o seu professor não vai.
Nesse artigo, eu pretendo não só tentar te convencer que a arte serve, de fato, para alguma coisa mas, além disso, te dar umas dicas para começar a usá-la a seu favor.
Ver arte pode não passar somente a ser divertido, mas também se tornar uma grande ferramenta para a sua inteligência. Como eu disse num artigo outro dia, a base da inteligência é a imaginação, e a arte é a forma principal de se adquirir figurinhas para compor um bom imaginário.
A arte é uma forma eficaz de entender os dramas humanos
Toda sociedade tem uma série de valores que delimitam as suas atividades. Por exemplo, não matar e não roubar são dois valores universais de praticamente toda sociedade civilizada que já surgiu no mundo.
Além dessas coisas mais básicas, é preciso haver certos valores mais profundos como a relação entre o homem e Deus. Não há sociedade sem essa ponte, ou seja, sem uma noção de realidade transcendente. Só a arte é capaz de transmitir essas coisas.
Em toda sociedade, haverá uma classe de pessoas que se esforça continuamente em aprender e repassar esses conhecimentos. Em algumas ocasiões, a melhor forma de cristalizar essas coisas é através de exemplos, como as fábulas.
Os contos de fadas, por exemplo, são feitos para serem alegorias que sejam atrativas para as crianças. Entretanto, neles sempre existe algum ensinamento precioso. Por isso mesmo, histórias como Chapeuzinho Vermelho são extremamente importantes.
Entretanto, para outras ocasiões, existem muitas outras formas de se fazer isso e se pode atingir praticamente todos os tipos existentes de pessoas. Pintura, escultura música e literatura, por exemplo, todas têm a sua função e o seu espaço.
A arte serve para comunicar os valores mais profundos
Para você entender bem como funcionam essas coisas, o ideal é fazer na prática. O que eu sugiro é ouvir esse trecho da Stabat Mater de Pergolesi. Faça esse exercício a sério, com fone de ouvido no silêncio e de preferência no escuro.
Dá pra saber do que se trata a música mesmo que eu não diga nada a respeito. Entretanto, é óbvio, até pela imagem do vídeo, que se trata de um tema do Evangelho. Você consegue, só ouvindo a música, descobrir qual é esse tema? Te dou a resposta no fim do artigo!
A boa arte é, no fundo, uma coleção dos dramas humanos. Por exemplo, as músicas que você ouve, independentemente do estilo, te dizem algo que você quer ouvir e que completa aquilo que você acha importante. Se essa música é boa ou se esses valores que você anseia são bons, é outra discussão, mas o fato é que elas expressam algo.
Para que serve a arte na prática
Tenho escrito freqüentemente aqui no blog a respeito de como interpreto algumas dessas obras. Por exemplo, eu vejo o Abaporu de Tarsila do Amaral de uma maneira muito diferente da versão oficial dos livros didáticos e professores de cursinho. Na verdade, se você ler o artigo, vai ver que eu deduzo dali o embrião de uma teoria sociológica que estou tratando em outros artigos aqui no blog.
Partindo da observação do Abaporu, percebi que precisava tentar descrever o que seria o contrário do verão brasileiro. Como eu tinha passado o inverno na Itália, tudo o que eu precisava estava nas minhas mãos, e então escrevi o ensaio sobre o simbolismo do inverno.
Estou dizendo isso apenas para exemplificar o processo. Foi uma obra de arte, que aliás é de uma escola que eu desprezo profundamente (o modernismo), que me deu o estalo que precisava. A função da arte é justamente essa!
O importante mesmo é deixar a arte falar com você. Aquelas que têm algo para te dizer irão se destacar espontaneamente.
O que nos diz a arte moderna
Se tem uma atividade de tortura que funciona perfeitamente é enfiar alguém num museu de arte moderna, especialmente um adolescente. Eu entendo perfeitamente a situação e acho que eles têm razão.
A menos que o seu cérebro já tenha sido dissolvido por alguma ideologia, um museu carregado de obras sem sentido ou de coisas apelativas causa vontade de sair correndo. Se , quando vai numa exposição dessas e sente isso, então a arte já falou com você!
O que ela disse foi: corre maluco!
É verdade. A arte moderna tem essa capacidade de causar mal estar. Eu sempre tive o costume de desprezá-la por ser esteticamente desagradável (quero dizer que é feio mesmo), sem sentido e feita por idiotas. Antigamente, quando não conhecia bem o assunto, eu tinha esse preconceito, confesso.
Entretanto, também, tenho que reconhecer que estava errado, muito errado. A arte moderna não é feita por idiotas incapazes e sim por idiotas, incapazes com deficiências cognitivas e algum instinto assassino. Não uso a palavra assassino como uma mera hipérbole, mas com sentido literal.
Existe uma relação entre a arte moderna, o movimento revolucionário e 60 mil homicídios por ano
Essas pessoas fazem arte desse jeito exatamente porque o seu desejo interior é o de exterminar a humanidade. Você consegue ver o ódio na arte moderna? Eu sempre consegui e, talvez, você também. É isso que faz você querer sair correndo de uma exposição dessas. Se você sente essas coisas, jamais negue, mesmo que o seu professor insista no contrário.
Por outro lado, passei a entender que essa era, justamente, a mensagem da arte moderna. É esse tipo de gente que estamos nos tornando. Ou você acha coincidência o mundo estar se degradando exatamente da mesma maneira? Você acha que o fato de o Brasil ter 60 mil homicídios por ano vem de onde? A única explicação é ter um impulso assassino arraigado no subconsciente de todo mundo.
A arte moderna já está avisando isso faz 50 anos. Porém ela não somente é um diagnóstico do fato atual, mas também das correntes culturais em circulação. Preste atenção à arte de um país e verá para onde ele vai. A sua vontade de sair correndo de um museu é apenas o seu instinto de sobrevivência te avisando. Jamais despreze esses sinais, eles são preciosos.
Aliás, se formos atrás das biografias dos autores dessas obras, veremos que todos, sem nenhuma exceção, são parte de alguma vertente do movimento revolucionário. Mais de 100 milhões de pessoas morreram, no século XX, vítimas dessas ideologias. Você ainda tem dúvida do instinto assassino dessas pessoas?
Não estou dizendo que um quadro mata alguém, mas as ideias erradas que estão na cabeça desses artistas se propagam por essas obras e desembocam em políticas que valorizam o crime e criam um banho de sangue. Arte é coisa séria.
O lado positivo da arte
Vamos adiante que nem tudo é sangue. Assim como a arte serve como uma ferramenta de diagnóstico, ela também atua como irradiadora de valores, que foi uma das primeiras coisas que disse ali em cima.
Conforme um valor se consolida na sociedade, os artistas se esforçam em reforçá-lo. É por isso que as igrejas e templos são os lugares onde mais se encontra obras de arte de alta qualidade. Faça uma pesquisa rápida sobre igrejas católicas, templos hindus e mesquitas no Google imagens e veja como essas coisas são elaboradas.
Quais mensagens você consegue tirar desses templos? Aliás, faça uma experiência que vai valer muito a pena. Vá na igreja mais bonita da sua cidade, de qualquer religião, e gaste um tempo olhando todas as obras que tem ali dentro. Você consegue entender a mensagem delas sem alguém te contar? Repita a experiência em igrejas de outras religiões e compare o que você viu!
A arte sacra tem como principal objetivo mostrar justamente os valores mais altos do espírito humano. É claro que, do jeito que estamos acostumados hoje, é difícil entrar numa igreja e sentir qualquer coisa dessas. Mas tente um pouco, apenas 5 minutos.
Toda grande civilização possui boa arte
O que quero que você entenda com isso é que a arte tem um papel importantíssimo no bem estar da sociedade e, por conseqüência, no seu estado mental. Pode reparar. Procure todas as grandes civilizações que já existiram e veja a sua arte. Nenhuma dessas civilizações tem uma arte tão pobre como a nossa atual.
Por outro lado, nenhuma outra teve nada parecido com a arte ocidental do século XVI e XVII. Só que a arte dessa época, apesar de ser tecnicamente incrível, era, também, materialista. Quem estivesse prestando atenção nessa época poderia saber o que está acontecendo hoje, afinal o materialismo é a mãe do movimento revolucionário.
Vou explicar isso num outro ensaio mas fica aqui registrado para reflexão. Aliás, você percebeu que a foto da capa desse artigo é um santo? Não? Então fica a dica. Tirei essa foto no Vaticano, na praça de São Pedro.
Como começar a gostar de arte
O primeiro passo é simplesmente não estudar as correntes e movimentos artísticos, nem os artistas e suas vidas. Na realidade, o melhor é começar vendo arte na internet mesmo.
Comece buscando por imagens no Google e vá guardando aquelas que gostar. Com o tempo, você vai pegando quais são as suas preferências e, naturalmente, vai acabar descobrindo o que elas estão tentando te dizer.
Acho que você já notou que eu não gosto das plaquinhas de museu, né? Aquelas com a descrição da obra. Isso aí é o primeiro passo para matar o interesse de qualquer pessoa. Mas não se preocupe. Sempre vai ter alguma coisa que vai te chamar a atenção, aí você vai lá e presta atenção nela.
Isso tudo não precisa acontecer num museu, obviamente. Pode ser um monumento na rua ou um quadro num consultório médico ou uma imagem do Instagram. Com o tempo, você vai reparando em coisas que antes nem via e isso ajuda muito na expansão da inteligência, que é uma das principais coisas para que serve a arte.
A arte serve para expandir o horizonte da inteligência
Se você ficar bom nesse exercício, não vai somente pegar olho pras coisas, mas vai começar a entender todas as coisas com muito mais clareza. Uma facilidade que quem costuma prestar atenção em arte tem é conseguir pôr em palavras aquilo que pensa com mais facilidade.
Isso ocorre porque, como disse ali em cima, a arte ajuda a aumentar a coleção de figurinhas do seu imaginário. Porém, não é somente isso. Como ela expande o número de situações e conflitos humanos que você pode imaginar, ela te ajuda a encontrar soluções para problemas que as pessoas sem essa cultura jamais encontrariam.
A arte tem a função te tornar as pessoas conscientes de realidades morais
Isso tudo pode parecer muito estranho por causa do nosso pensamento positivista. O que quero dizer é que estamos acostumados a achar que só podemos moldar a nossa inteligência conscientemente. Existe esse mito, por exemplo, de que a educação combate a criminalidade. Se isso fosse verdade, advogados não cometeriam crimes, afinal eles estudaram todo o código penal.
O que impede uma pessoa de cometer um ato mal não é o quanto ela estudou atos bons e maus, mas o quanto a sua consciência absorveu, como experiência real, os atos bons ou maus. É fácil entender isso com um exemplo bem simples. Vamos dar uma olhada no artigo 121 do código penal:
121. Matar alguem: Pena – reclusão, de seis a vinte anos.
Agora, imaginemos a versão artística do crime de homicídio como, por exemplo, no quadro de Paul Cezanne, abaixo.
O que você acha que funciona mais para entender a realidade de um homicídio? Gaste cinco minutos lendo o artigo 121 do código penal (é quase impossível mais que 10 segundos) e depois gaste os mesmos 5 minutos tentando descrever tudo o que puder do quadro de Cezanne. Qual das duas experiências é a mais real? Qual delas te faria imaginar-se como vítima e como assassino?
Talvez argumentem que lendo o código penal alguém tenha medo de ir para a cadeia. Mas, vendo o quadro de Cezanne, todo o ódio e sofrimento da cena, seu medo vai ser muito pior, o de se tornar uma pessoa má. Mesmo que você faça a opção em ser mal, ainda assim, vai ter a noção de que o crime será irreversível.
A arte serve para formação da consciência moral
A diferença fundamental entre as duas representações é que o código penal trabalha a imaginação apenas de maneira esquemática muito pobre e distante, enquanto uma pintura trabalha todos os outros aspectos. Dependendo do sucesso do artista, é possível até imaginar o cheiro do sangue. É óbvio que isso é muito mais realista.
Do mesmo modo, a literatura pode ajudar a criar um ambiente ainda mais propício para o desenvolvimento da imaginação moral. Quem ler Crime e Castigo de Dostoievski fará um longo e profundo mergulho na consciência atormentada de uma pessoa que cometeu um assassinato.
Falo muito em exemplos negativos aqui, e isso ocorre porque são eles que dão o peso e a gravidade real do drama humano. Se eu só escrevesse coisas bonitinhas, duvido que elas teriam algum efeito. Ademais, parece que a desgraça tem um atrativo extra para a consciência humana.
Acho que deu pra passar o recado e, quem sabe, você passe a apreciar melhor a arte daqui pra frente.
Em tempo: Stabat Mater narra o sofrimento da Virgem Maria durante o martírio de Jesus. Existem muitas peças de compositores diferentes com esse mesmo nome porque é um tema tradicional católico. Entretanto, Pergolesi é, de longe, o meu favorito. Nenhum outro captou o sofrimento como ele.