Amadores tiram fotos coloridas, profissionais tiram fotos que direcionam a emoção usando a luz. Essa é uma daquelas coisas que mudam o rumo da nossa carreira depois que a gente entende, e é por isso que eu acho que saber controlar as cores na fotografia é a dica matadora que pode fazer aquele salto quântico no nosso trabalho.
Durante um bom tempo eu me perguntei porque as minhas fotos eram tão sem graça, e também fui reparando que todas eram coloridas demais e que pareciam, muitas vezes, até mesmo vulgares. Então fui prestando atenção nos melhores fotógrafos que consegui encontrar no Instagram e a ver muitas aulas no Youtube. Foi aí que me toquei de uma coisa fundamental: todas as cores das minhas fotos não faziam sentido. Cara… deu vontade de jogar tudo fora.
Então, nesse artigo, eu vou tratar de uma coisa que todo mundo que leve um pouco a sério esse dispositivo de vidro e plástico que tem na mão precisa entender, que é a roda de cores (em inglês é hue wheel, que seria mais como roda de matizes, e que faz mais sentido. Porém, aqui o termo é roda de cores mesmo).
Cores e emoções
As cores são importantes na fotografia porque são elas que dão a emoção nas fotos. Dê uma olhadinha numas fotos preto e branco e vai perceber como elas são frias no sentido emocional. Geralmente, as fotos monocromáticas transmitem mais a noção de forma e de contexto do que de emoção, e essa é uma dica importante quando se fala de cores na fotografia. Preto e branco é excelente para reduzir o conteúdo emocional e as cores fazem justamente o contrário, e eu tenho um belo tutorial sobre isso.
Existem alguns exemplos bem simples para entender como funciona esse negócio. O mais óbvio é o de temperatura. Tons azulados representam frio, lembram mais o gelo e a neve (inclusive, pra quem gosta de filosofia, eu tenho um artigo bem legal aqui sobre esse assunto, que é o simbolismo do inverno). Já os tons avermelhados representam o calor, porque coisas quentes como a brasa são alaranjados. Do ponto de vista da física essas relações não são bem verdade, mas eu vou deixar meus cacoetes de físico pra lá por enquanto.
Vibração e excitação
Outro exemplo importante, fotos que possuem muitas cores vivas diferentes e complementares criam uma sensação de vibração. O modo como esses objetos coloridos são espalhados pela foto também são responsáveis por estimular o expectador. Veja o exemplo abaixo. Nessa tela, as emoções estão ultra excitadas e por toda a parte, praticamente dominadas pelo caos. Eu diria que isso praticamente representa um estado de excitação sexual mesmo.
Já essa outra tem muita cor, mas é perfeitamente ordenada e geométrica. Ela tem o elemento de vibração mas não tem o de excitação, então ela representa algo muito mais próximo de uma alegria inocente, infantil. Acho que deu pra notar onde quero chegar.
Então, do mesmo modo que dá pra ter emoções fortes e intensas de acordo com o uso da cor, também dá pra ter emoção nenhuma se você tiver uma foto muito apagada, tipo essa abaixo. As cores são apenas variações muito pequenas de um tom de verde oliva. Por outro lado, como não há muito drama, essa imagem inspira paz. É por isso que ela é um bom quadro de sala, por exemplo.
Também tem como fazer fotos completamente sem graça, que ninguém vai querer ter nem no porão de casa, e eu vou te mostrar um exemplo e explicar porque isso acontece no final do artigo. Então, segue o fio.
Entendendo a roda de cores
O conceito fundamental que a gente tem que dominar pra fazer as cores combinarem, como eu disse lá na introdução, é a roda de cores. Nela, todos os tons primários são ordenados numa determinada seqüência, e essa seqüência é que a parte mais fundamental da coisa toda. A dica a respeito das cores na fotografia consiste, basicamente, em aprender a usar as chamada cores análogas, que são as próximas; e as complementares, que são as opostas. A roda de cores é essa que está abaixo, e eu recomendo muito que você a decore.
Cores análogas
A gente precisa decorar duas coisas da roda de cores: a seqüência e as cores opostas, e essa é a primeira dica no que diz sentido à roda de cores na fotografia. A seqüência é a mesma do arco-íris, e vai em ordem crescente de comprimentos de onda. Então a seqüência é azul, ciano, verde, amarelo, laranja, vermelho, magenta, violeta.
A partir da seqüência, é fácil saber quais são as cores análogas, basta pegar um par que esteja em seqüência. Por exemplo, azul e ciano, amarelo e laranja, magenta e violeta. Como a seqüência é cíclica, violeta e azul são análogas e, na verdade, você pode começar a decorar a seqüência pela cor que quiser. Qualquer combinação dessas cores já vai ficar bem legal. Na figura abaixo, um exemplo de cores análogas na roda de cores.
Exemplo de paleta com cores análogas
Nessa foto abaixo, temos um bom exemplo de uma composição que explora um espectro de cores análogas. Nela, o fotógrafo usou tons de um verde claro e de um azul meio violeta, que também têm direção. Além disso, note que é um gradiente entre o azul no chão e o verde no topo das árvores.
Olhando essa imagem, eu fiz um diagrama das cores predominantes da foto usando a roda de cores. Isso aí eu fiz a olho mesmo, e era o meu exercício pra entender as cores em uma foto. Eu marquei mais ou menos onde estão as cores predominantes, que é o verde claro das folha das árvores e o azul meio rosado do chão. Daí você pode notar que praticamente não tem nenhum magenta, nem vermelho, nem laranja. Talvez tenha um pouco de amarelo ali na parte que o sol entra na foto, no canto superior direito, que eu não marquei.
O que é uma paleta de cores?
Então, essa parte acinzentada da roda de cores são as que são menos intensas. Elas ainda existem na foto, não se engane, mas numa intensidade muito mais baixa que as dominantes. As cores que foram usadas, e que são obtidas como variações das cores análogas dominantes é o que a gente chama de paleta. Sim, a paleta é exatamente o mesmo conceito que se usa na pintura. O pintor pega algumas tintas das cores dominantes e vai misturando até obter uma seleção de cores que ele vai usar para pintar a tela. Eu sempre digo que a fotografia e a pintura são primas de primeiro grau, e esse é um dos pontos de encontro.
Em outras palavras, a paleta é as combinações de cores que são permitidas numa certa combinação. É mais ou menos como se a gente combinasse as regras antes de começar a fotografar. Uma outra coisa importante é que uma paleta de cores análogas bem feitas cria uma sensação de continuidade e conformidade, então ela é ideal quando se quer representar estados emocionais mais estáveis, causam uma boa sensação de paz e tranqüilidade, especialmente quando são cores mais frias.
Cores opostas ou complementares
Vamos voltar para a roda de cores e olhar agora as que estão em oposição, quer dizer, aquelas que estão 180? umas das outras na roda de cores. Elas são ciano e vermelho – que é o exemplo abaixo; verde e magenta, amarelo e azul, laranja e o meio entre azul e ciano. Decora isso aí também porque é uma das coisas mais importantes para saber sobre cores na fotografia, e é mais uma dica preciosa.
Exemplo de paleta reduzida de cores opostas
Uma observação crucial é que a oposição do laranja não cai exatamente nem no azul e nem no ciano, mas ali no meio. Na verdade, o laranja fica bom mesmo é quando tem aquele azul marinho mais queimado. Dê uma olhada nessa foto abaixo, ela é um exemplo perfeito disso. Nessa aí o cara explorou as cores complementares durante uma tempestade e o resultado é realmente como uma explosão, ao contrário das cores análogas, que expliquei ali em cima.
Vamos dar uma olhada em como fica a paleta nesse caso. Na figura abaixo, coloquei as duas cores predominantes da foto acima. Fiz a olho mesmo, como exercício, até porque esse é um conceito que é mais importante entender qualitativamente do quantitativamente, quer dizer, não precisamos de números exatos para entender a coisa toda. Assim como no exemplo anterior, existem cores que praticamente não estão presentes na foto, que são o magenta, o verde, o violeta e o amarelo, então, aqui, a paleta também é bem reduzida. Reduzir a paleta, além de usar cores análogas ou opostas é mais uma dica crucial pra acertar as cores da fotografia na mosca. Inclusive, uma paleta reduzida é muito melhor que uma muito ampla.
Paleta muito ampla
E o que acontece quando a gente não limita a palheta de cores? O resultado é como essa foto abaixo, uma composição completamente sem graça e praticamente caótica, pra não dizer brega. É só um monte de coisa colorida e sem sentido, e é o tipo de foto que todo amador posta em redes sociais. Você pode até ganhar umas curtidas porque ela chama atenção, e coisas coloridas chamam atenção mesmo. Só que, artisticamente não tem valor nenhum.
Anatomia de uma foto sem graça
Porém, eu gostaria de terminar esse artigo explicando porque uma foto sem graça é sem graça. Essa foto abaixo eu tirei em Perugia, na Itália, em 2019. Ela tem uma série de erros, e seria um exercício bem legal você ler esse artigo aqui e tentar descobrir por si próprio quais são. No entanto, nesse artigo aqui, eu vou focar só nas cores, que é o assunto dele.
Essa é uma foto que não causa sensação nenhuma. É só uma arquitetura típica europeia, muito bonita, mas entediante. A composição até que tá razoável, mas ela é ultra sem graça. Já me arrependi de um dia ter postado essa foto no Instagram. Mas vamos dar uma olhada nas cores dominantes pra entender bem o que deu errado.
Estrague uma foto com cores desconexas
Na roda abaixo eu marquei mais ou menos as cores dos fatores dominantes, e ela é uma dica muito boa para entender como as cores fazem ou desfazem uma boa fotografia. Acho que também já deu pra entender o trocadilho ambíguo do título desse artigo, dá pra detonar tanto no sentido positivo quanto negativo!
Nessa foto, a gente vê que os três elementos de maior peso são o céu, a igreja e o mato. O céu é bem azul, praticamente monocromático. Por outro lado, o mato varia entre verde escuro e preto e a igreja em tons de marrom abafado, que marquei ali na região entre o verde e o amarelo, mais ou menos. Em todas as regiões, a paleta de cores é bem restrita, não tem nenhuma variação muito grande em torno das cores dominantes.
Já as cores dominantes não são nem análogas e nem opostas. Elas são simplesmente cores soltas e sem relação nenhuma. Por conta disso, não causam nenhuma sensação, não criam tensão nenhuma. É uma foto de um dia normal que as pessoas olham e falam ‘Ah, tá.’. That’s it. Boring as f&$k.
Na verdade, a grande maioria das fotos brasileiras que vejo no Instagram têm problemas desse tipo, e as pessoas tentam compensar aumentando a saturação e a vibração até o máximo, o que só piora o problema e cria fotos apelativas e cansativas. Tem como fazer fotos coloridas bonitas, mas não é toda foto colorida que é bonita.
Como conseguir cores perfeitas?
O primeiro passo é aprender a observar as cores do ambiente e a fotografar naqueles horários que a própria luz natural fornece cores análogas ou opostas. Nesse sentido, os dois exemplos de paleta natural ideal são o nascer e o pôr-do-sol. Já o sol do meio do dia favorece uma paleta dessas sem graça, mas que pode ser interessante se a cena em si tiver cores que se complementam. E também tem o recurso da edição, que eu vou mostrar num artigo próximo, até porque esse aqui já ficou longo demais. Se você não quiser perder a seqüência, marca esse blog nos seus favoritos ou me segue no Instagram, que eu vou postar as novidades por lá.